A Simplicidade das Coisas — Augusto Martini

abril 2, 2018

Reciclagem de lixo urbano

Meu pai era grande conhecer de plantas medicinais, árvores e todo tipo de mato. Por ter nascido na roça e vivido nela 20 e poucos anos de sua vida, tornou-se um expert no assunto. Também conseguia fazer a previsão do tempo – olhava para o céu e sabia se faria sol, chuva ou frio. Olhava a movimentação das formigas e dizia que viria chuva forte. Meu gosto por terra e plantas herdei dele.

Sempre teve uma pequena oficina nos fundos de nossa casa. E nela tinha de tudo. Ele era um acumulador no bom sentido. Tudo o que achava na rua, em caçambas e no lixo que jogavam em terrenos baldios e que tivesse alguma utilidade, levava para casa. Nesse rol estavam incluídos pregos, parafusos, e principalmente madeiras, que era sua matéria prima.

Tinha uma carrocinha (fotos nesse post), feita por ele e com ela saía pelo bairro em busca de material. Encostava rente ao meio-fio e colocava dentro dela, do jeito que dava, uma poltrona velha “esquecida” na calçada, uma cadeira quebrada, tábuas de demolição, pedaços de caibro, restos de móveis. O processo não durava mais de três minutos e se repetia com frequência. As vezes demorava mais, pois volta e meia parava para recolher objetos maiores como porta, janela…

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Meu pai, Antonio Martini, era um ecologista nato

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Ele construiu essa carrocinha das fotos e com ela saía pelas ruas de Rio Claro pegando pedaços de madeira que estavam jogados em terrenos e caçambas… que se transformavam em cadeiras, bancos, escadas… As sobras das madeiras alimentavam o fogão a lenha.

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Herdei a carrocinha e pensava em reforma-la para usar em minha chácara, meu sonho de consumo para quando aposentar. Agora nem sei mais se realizarei o sonho de morar em uma chácara! Assim, a dei de presente ao meu primo José Carlos Duarte, que a reformou e a levou para sua Pousada das Seriemas, em Minas Gerais.

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A carrocinha reformada. Fiquei muito emocionado.

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O banco de madeira dessa foto tem nome: Toni, em homenagem ao meu pai. O Zé o confeccionou com o serrote que era dele. “Seu” Antônio deve estar muito feliz vendo que os tesouros dele estão sendo preservados.

Quando chegava em casa matutava o que fazer com a peça. Ficava tentando adivinhar em que aquele lixi iria se transformar. Para ele, lixo era uma economia. Ele não tinha vergonha ou nojo do que fazia – reciclar o lixo urbano.

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A alegria dele era quando alguém dizia: “tem uma cadeira jogada em tal lugar”. “Pedaços de caibro em Peroba Rosa na esquina da Igreja”. “Uma porta de armário, todinha em Embuia (madeira nobre) num terreno baldio”. Ficava sorridente e assim que sobrasse um tempinho ia logo buscar.

Esse “lixo” todo ele transformava em alegria. Alegria em fazer o que ele gostava. Alegria em deixar parentes felizes ao ganhar um banquinho que abria e fechava e  era fácil de carregar. Alegria em salvar o que ia pro lixo, alegria em gastar tempo para deixar algo que era “lixo” mais doce de se olhar e agradável de usar. Uma escada, uma mesinha, uma cadeira….

As pessoas têm que parar para refletir que nem tudo é lixo. Temos que aprender a reciclar, e a pensar na sustentabilidade do planeta. Andando pelas ruas a gente vê coisas ótimas que podem virar móveis de verdade.

As pessoas no Brasil ainda vêm o lixo como um produto com a qualidade vencida. Mas existe beleza e luxo por trás dele. Os artistas plásticos que transformam o descarte em obra de arte, como são os casos de Vik Muniz e Franz Manata, têm o seu trabalho respeitado pela sociedade. O mesmo não aconteceu com o meu pai, a não ser pelos meus olhos e de seus próximos, ou com o catador, que é visto como um mendigo. Ambos sobrevivem dos restos descartados pelo consumo, mas têm tratamentos diferentes. Precisamos reverter isso.

 

3 Comentários »

  1. Seu pai era um artista, assim como todos os Matrtini todos tem o dom do trsbalho artezanal, meu avô Victorio Martini era ferreiro confeqsionava ferramentas manualmente, e todos seus filhos e netos trazem ou trazemos o dom em nossas mãos, cada um de uma maneira. Do mais sensível ao mais rústico. …

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    Comentário por Dal Matrtini — abril 3, 2018 @ 0:44 | Responder

    • Bom dia Dal. Muito agradecido pela visita e comentário ao post. Tenha uma ótima terça feira. Abraços. Augusto

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      Comentário por Augusto Martini — abril 3, 2018 @ 8:10 | Responder


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