Eu cresci, as cidades cresceram, o mundo evoluiu e a tecnologia tomou conta de tudo. Minha infância foi vivida em Rio Claro/SP, o adensamento populacional da cidade e o avanço da urbanização alteraram muito as maneiras como as crianças passaram a se divertir. O desenvolvimento tecnológico e a falta do espaço público para as brincadeiras infantis redefiniu com rapidez as maneiras de a molecada interagir, conversar, pular, dançar, correr e inventar o mundo.
Algumas brincadeiras do meu tempo de moleque sumiram nos dias atuais. Eu adorava, por exemplo, rodar pneu. Um moleque era colocado dentro de um pneu grande, sem a câmara de ar; outra fazia a roda girar por uma grande extensão. E foi assim que eu tive a primeira e única quebra de osso em minha vida! Trinquei o braço esquerdo. Fiquei 30 dias engessado e tendo que aprender a escrever com a mão direita! A sensação de desconforto causada pela posição do corpo face ao movimento da roda (vez por outra alguém passava mal, vomitava ou se esborrachava) era descontada pela excitação que o movimento arriscado gerava. Rodar pneu era adrenalina pura!
Pular carniça era outra brincadeira que dependia de espaço, a começar pela corrida de média distância que definia quem seria o mestre e quem seria a vítima (o “carniça”) da ocasião. O carniça comia o pão que o diabo amassou e era alvo de chacotas. O carniça era o centro das brincadeiras mais destrambelhadas. Dos vários comandos do jogo — gavião, tapar o fogareiro da velha, ver se tem água na torneira, etc. —, muitos deles dependiam de um lugar aberto para que a molecada se corresse.
E tinhas outras brincadeiras como a cabra-cega, queimada, polícia-ladrão, jogo de taco, dono da rua e uma quantidade impressionante de piques. Todas as atividades eram realizadas ao ar livre, nas ruas de chão batido, nas quais quase nunca passava um carro.
Se você é daqueles que acham que uma brincadeira que morre é uma catástrofe ecológica, como uma árvore cortada sem motivo, pode juntar-se a mim. Todas essas brincadeiras fazem parte da cultura de um povo e cultura eu entendo como sendo o conjunto das maneiras peculiares que os povos criam para comer, rezar, dançar, trabalhar, lembrar os mortos, louvar os vivos, festejar, lamentar e brincar. Por isso gosto de escrever tanto sobre minha infância. Para tentar preservar algumas coisas que se perderam ou se perderão no tempo daqui há alguns anos.
Hoje é impressionante a quantidade de crianças que mais parecem pequenos adultos. Os pais os enchem de compromissos, horas marcadas para cursos, responsabilidades, dramas, estresses e ansiedades. E como há crianças obesas! Um horror!
Sigo sendo um ativista das brincadeiras, um ecologista de plantão, mesmo sentindo que falo com as paredes na maioria das vezes. Um mundo em que os adultos perderam a capacidade de brincar é doente. Um mundo em que as crianças perderam a possibilidade de brincar na rua me parece infinitamente pior. Assim, prefiro pensar que nos dias violentos que vivemos hoje, as brincadeiras de polícia-ladrão continuam sendo aquelas mesmas que eu e meus amigos vivíamos…
Oi! Queria que soubesse que indiquei você para o prêmio The Versatile Blog Award. Você merece muito! Bjs. A indicação pode ser vista aqui. https://wordpress.com/post/vidaintensavida.wordpress.com/2110
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Comentário por Alda M S Santos — junho 4, 2017 @ 19:11 |
Boa noite! Fico-lhe muito agradecido pela indicação. Um abraço, Augusto Em dom, 4 de jun de 2017 às 19:11, A Simplicidade das Coisas — Augusto
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Comentário por Augusto Martini — junho 4, 2017 @ 22:24 |
Merecido! 😘
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Comentário por Alda M S Santos — junho 5, 2017 @ 8:08