A Simplicidade das Coisas — Augusto Martini

julho 25, 2016

Lembranças de infância

Quem passa aqui pelo A Simplicidade das Coisas sabe que gosto de escrever sobre minha infância. Perto da infância que meus sobrinhos tiveram, a minha aconteceu sem grandes diversões, mas hoje vejo que tudo teve muito valor.

Nasci em uma casa de colônia na Haras e Fazenda São José do Morro Grande, no Distrito de Ajapí, que pertence à Rio Claro/SP, onde meu avô era o administrador, meu pai o tratorista, minha mãe cozinheira e meus tios colonos. Tínhamos apenas um rádio. Nada de TV ou das modernidades que temos hoje. As casas não tinham muros – nem na colônia e nem na casa que fomos morar na Vila Alemã, depois que meus pais vieram morar na cidade. Podíamos conversar com os vizinhos, plantávamos as coisas no quintal, criávamos porcos e frangos e tínhamos uma horta. Nossa comida era natural, sem agrotóxicos, tirada ali, do nosso próprio quintal…O único problema era saber que a linguiça era tirada daquele porco do quintal o qual ajudei a criar. E que tantas vezes vi meu pai sacrificar bem ali, na minha frente. Idem para as galinhas e frangos…E isso me ensinou a dar valor da vida! E também foi isso que me fez ter optado por ser ovolactovegetariano por muitos anos!

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Lembro que em muitas tardes tinha a missão de molhar a horta, e que no meio dos canteiros de verduras e árvores frutíferas tinha os canteiros de flores de minha mãe e avó. Eu ficava lá com a mangueira, borrifando a água e pensando nas coisas que iria fazer…Nos gibis que lia. Sim, eu lia muito. Era minha distração. Li também todos os livros do Monteiro Lobato e do Júlio Verne. Hoje existem outras distrações, lê-se pouco e escreve-se mal.

Minha mãe e meu pai não me defendiam dos perrengues da escola, pelo contrário. Sempre era minha mãe que ia nas reuniões da escola. Eu sentia um frio na barriga! Coitado de mim se por acaso a professora dissesse qualquer coisa que eu tivesse feito de ruim: apanharia sem dúvida! Eles não me poupavam: o que era certo era certo e ponto. Eles me ensinaram a respeitar hierarquias. Hoje tudo está muito diferente: os pais defendem os filhos que até agridem os professores…

Sou da época em que minha mãe preparava pão caseiro, bolo de fubá, curau de milho, doce de leite, doce de abóbora, doce de goiaba, doce de banana, tudo feito no fogão a lenha e cozinhava o leite até virar leite condensado  o qual passávamos no pão. Também comi muito pão com banha de porco! Era o meu lanche no recreio da escola.

Sou da época onde professores eram respeitados e valorizados e os pais e os professores eram rígidos e estavam juntos para cobrar responsabilidades dos alunos. Aprendi a ter responsabilidade na vida. Aprendi a respeitar e mostrar gratidão pelo que me fazem! Hoje é incomum um adolescente mostrar respeito e gratidão, parece que todos viraram inimigos. E as músicas que fazem sucesso incitam o ódio e a violência, quase sempre com conotação sexual.

Meus pais nunca me pouparam de minhas responsabilidades. Nunca tive mesada, e tive o meu primeiro emprego com 15 anos de idade. Trabalhei de balconista em um bar/padaria/mercearia, estabelecimento que um meu tio arrendou. Aprendi a gerenciar valores. Aprendi a dar valor para cada coisa sem desperdiçar. Hoje o consumismo é desenfreado – e isso é válido para todas as idades. Nada satisfaz, sempre é preciso mais.

Hoje o que as pessoas querem é ostentar. Na minha época, ostentar era participar do orfeão, a recitar poesias em jograis.  Atualmente nada que é intelectualizado merece valor.

Sim, minha infância foi pobre. Aprendi desde muito cedo a fazer trabalhos manuais, a plantar, a adubar a terra, a reconhecer plantas, bichos e árvores. Aprendi a desenvolver habilidades. Se quisesse algo tinha que batalhar. As coisas não caiam do céu. Cada um tinha que se virar. Até ajudei minha mãe e irmãs a bordar e recortar jogos de mesa pintados a mão e feitos em tecido de naylon. Aprendi a ter orgulho de trabalhar e conseguir as coisas pelo meu próprio esforço.

Na minha infância os pais não se intimidavam em ensinar e em repreender. Fui conhecer a praia com 19 anos de idade. Frequentei muito a igreja, aprendi a ter fé, a rezar, a agradecer. Aprendi que preciso evoluir espiritualmente para ser uma pessoa melhor.

Não tenho filhos. Mas se tivesse, teriam uma infância pobre de coisas para poderem crescer e serem ricos como seres humanos. Meus pais me deram exemplo de dignidade, de trabalho, de honestidade, de perdão, de gratidão, de respeito e fé… Assim, pensando bem, não sei se tive uma infância tão pobre.

2 Comentários »

  1. Augusto!

    Você está sentado num trator? É um trator?

    Eu nunca havia visto um como o da foto…

    Também não sabia que você havia nascido na Fazenda São José…

    Numa de suas últimas postagens, também fiquei impressionado com uma foto de seu pai… Ele sentado, com um cachorro… As mãos e os pés dele chamaram minha atenção… Me pareceram símbolos do trabalho, símbolos de um trabalhador…

    Um grande abraço,

    Adriano

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    Comentário por Adriano Picarelli — julho 25, 2016 @ 22:53 | Responder

    • Bom dia Adriano. Este era o trator com o qual meu pai trabalhava na Fazenda. Sim, o Sr. Antonio era o símbolo do trabalhador na verdadeira essência da palavra. Grande abraço, meu amigo. Augusto

      Curtir

      Comentário por Augusto Martini — julho 26, 2016 @ 8:17 | Responder


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