Trabalhei no Arquivo do Município de Rio Claro/SP de abril de 1985 até junho de 2000. Nesses 15 anos de trabalho aquela autarquia municipal passou por várias direções e muitos desafios. Mas, todos os dias tínhamos uma visita frequente – José Constante Barreto. Um senhor de pequena estatura, cabelos brancos e Integralista. Suas visitas diárias eram para saber o que estávamos fazendo com a documentação, muitas vezes nos auxiliava na identificação de fotos e queria saber o perfil dos consulentes do acervo do “Chefe”. E quando perguntado: “o sr. foi Integralista?” Ele, com seu olhar altivo e seguro dizia: “Eu não fui. Eu sou Integralista! Anauê!”
O Sr. Barretinho, como carinhosamente o chamávamos, era filho adotivo de uma família tradicional da cidade. Contava que havia sido deixado na Roda dos Excluídos*, em São Paulo. Certa feita, ditou-me uma carta que enviamos para a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Naquela altura da vida, já passando dos 80 anos, teve vontade de saber quem era sua mãe biológica. Não conseguiu saber, infelizmente.
* Até 1948, mães carentes, geralmente solteiras, que não podiam criar os filhos recém-nascidos, deixavam-nos na Santa Casa, anonimamente. No muro havia um compartimento giratório que recebia essas crianças. Um sino alertava a religiosa de plantão, que retirava a criança e virava novamente a abertura para a rua. As freiras cuidavam da criança, que depois seguia para o asilo Sampaio Viana, no Pacaembu e mais tarde para o Colégio São José. Havia uma ata, em que se registravam as informações deixadas pelas mães. A maioria preferia rasgar um santinho e deixar metade com o filho; quando a mãe buscava de volta sua criança, trazia a metade que faltava, como uma espécie de comprovação da maternidade.
Eu e ele ficamos amigos. E frequentemente me contava algumas histórias… Lembro de uma delas claramente, onde dizia que na ocasião do golpe de Getúlio, Plínio Salgado foi exilado e que para esse exílio, em Portugal, levou um punhado de terra aqui do Brasil. Logo em seguida Getúlio começou uma perseguição aos Comunistas e Integralistas, que na época tinham ideologias diferentes. O Sr. Barretinho que era da milícia e um dos líderes na cidade de Santos/SP guardava alguns documentos importantes, com nomes de centenas de companheiros Integralistas. Como estava sendo perseguido (ele foi preso também) e tendo que esconder esses documentos, procurou um amigo pessoal, um rapaz dono de uma livraria. Esse amigo, vendo o desespero do Barretinho em proteger os documentos e os amigos se propôs a guardá-los, a escondê-los. Passada a crise, o Sr. Barretinho voltou na livraria e o amigo tirou os documentos que estavam bem escondidos atrás de alguns livros e entregou-lhe. Ele sempre soube que o rapaz era comunista, e o amigo sempre soube que o Barreto era Integralista. Eles discordavam na ideologia, mas eram dois homens de honra, coisa que hoje não existe ou é como achar agulha em palheiro. Para as pessoas daquela época a amizade, a lealdade, estavam acima das ideologias, pois entendiam que sobretudo eram brasileiros lutando por ideais diferentes, mas acreditavam que estavam lutando pelo Brasil, pela Pátria e por suas ideologias.
Bem, já deu para perceber que um dos desafios do Arquivo era o de preservar a memória de Plínio Salgado, fundador da Ação Integralista Brasileira (AIB).
Durante a crise econômica e política que abalou o Brasil na década de 20, muitas correntes ideológicas se organizaram com o objetivo de criticar a ordem imperante. Esses movimentos extrapolaram os anos 20 e chegaram à década de 1930, no governo de Getúlio Vargas, com grande força.
Um dos mais significativos movimentos de contestação foi a Ação Integralista Brasileira, fundada e idealizada no dia 07 de outubro de 1932, por Plínio Salgado. O Integralismo, visto como um movimento essencialmente autoritário teve sua ideologia marcada pelo ultra-nacionalismo e a luta contra o capitalismo financeiro internacional, liberalismo e, obviamente, contra o socialismo e o comunismo.
Plínio Salgado nasceu em 1895 na cidade de São Bento do Sapucaí, no estado de São Paulo e faleceu em 1975. No ano de 1916 ingressou no jornalismo e foi o redator do jornal Correio de São Bento. Em 1918, casou-se com Maria Amélia Pereira e, que morreu em menos de um ano depois, deixando sua única filha de 14 dias. Casou-se novamente pela segunda vez, em 13/04/1936, com Carmella Patti Salgado, nascida em 1914, em Taquaritinga (SP), filha de Fortunato Patti e Maria Pagliuso Patti, e que faleceu em agosto de 1989.
Plínio foi um Nacionalista convicto e fascinado pelo Fascismo de Mussolini. O Arquivo de Rio Claro guarda uma relíquia da história nacional – o acervo pessoal de livros, cartas, documentos e outras objetos pertencentes ao integralista. Todo o acervo foi doado por Carmella Patti Salgado logo depois da criação do Arquivo. E, por vários meses em todas as quintas e sextas-feiras ia até a instituição para auxiliar na organização documental.
No Arquivo existem 113 mil páginas de correspondências enviadas e recebidas, que eram datilografadas com papel carbono para que Plínio mantivesse em seu arquivo uma cópia do que enviava para amigos e correligionários. Nem tudo está devidamente indexado, mas o Arquivo permite o acesso a parte do material. Lembro-me que só as cartas ocupam três armários devidamente catalogados e por período, que sob o olhar de especialistas pode esclarecer parte história brasileira.
Um pouco mais sobre o Fundo Plínio Salgado, que faz parte do acervo do Arquivo de Rio claro
(Fonte: site do Arquivo Público e Histórico de Rio Claro)
Plínio Salgado dedicou-se, simultaneamente, à literatura, à política, ao jornalismo e ao comércio editorial, como proprietário da Editora Clássica.
Plínio foi o mais influente e controvertido ideológico e ativista da direita brasileira defendendo teorias de nacionalismo puro. Em 1932, fundou a Ação Integralista Brasileira que pregava um nacionalismo rigoroso e exacerbado baseado em um regime político unitário, hierárquico e corporativista. Tendo como lenda “Deus, Pátria e Família”, o movimento procurava atingir o âmbito nacional ramificando-se pelas diversas partes do país.
O acervo é composto por 40.970 correspondências de 1926-1976 (61.194 páginas); mais de 400 livros, particularmente as obras doutrinárias de Plínio Salgado e publicações de autores integralistas; atas produzidas pelos núcleos da Ação Integralista Brasileira e diretórios do Partido de Representação Popular; 6 762 fotos familiares e políticas envolvendo a Ação Integralista Brasileira e o Partido de Representação Popular ; 570 exemplares de jornais e revistas, com destaque para A Offensiva (1934-1938), O Aço Verde (1935) e Monitor Integralista (1933-1937), Revista Anauê (1935-1937), Acção (1931-1938); além de objetos pessoais e material de propaganda política como botons, distintivos, medalhas, bandeiras, adesivos, louças etc.
Abaixo, links para acessar aos inventários do Fundo Plínio Salgado:
Inventário – Plínio Salgado – parte I
Inventário_Plínio_Salgado_parte II – Divisão_de_Arquivos_Pessoais
Relação de Livros_Biblioteca_Plínio_Salgado
Periódicos_Fundo_Plínio_Salgado
Relação_de_fotos_Fundo_Plínio_Salgado
Contagem manuscritos Plinio Salgado
Tese – “Integralismo e ideologia autocrática chauvinista regressiva: crítica aos herdeiros do sigma”. Jefferson Rogrigues Barbosa:
“…O Brasil perde com a morte de Plinio Salgado um de seus nomes mais ilustres, aquele que representa na vida do país uma página admiravelmente gloriosa.
Romancista, sociólogo, pensador, parlamentar, homem de ação política, dele partiu a primeira voz que, de costas voltadas para o mar, anteviu a necessidade da integração nacional, indicando às gerações moças as veredas dos Bandeirantes, rumando para o Oeste.
Seu valor literário lhe concede a autêntica palma da imortalidade e sua “Vida de Jesus” o inscreve entre as maiores expressões da cristologia.
Sinceramente convencido das transformações políticas, defendeu suas idéias bravamente, vindo posteriormente a tornar-se um evangelizador que levou a todos os cantos da pátria uma mensagem de civismo.
Guardo de Plinio Salgado uma recordação indelével e tenho certeza de que sua memória jamais se misturará à poeira dos anos porque ele deixa uma obra consistente e definitiva.(…)
Resta-nos o consolo da certeza de que o seu nome vai perpetuar-se como um símbolo iluminando o futuro.” JUSCELINO KUBITSCHEK DE OLIVEIRA, em carta a D. Carmela Patti Salgado, viúva de Plínio Salgado, a 18 de dezembro de 1975
Gostei de conhecer um pouco de Plínio Salgado.
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Comentário por Dully Pimenta — janeiro 24, 2013 @ 11:12 |
Severo Fournier, liderando os integralistas, atacou, em 11 de maio de 1938 , o Palácio Guanabara . Eram 80 ao todo, dentre eles um membro da família imperial brasileira. Em resposta, muitos foram fuzilados, outros tantos feridos. Cerca de 1500 integralistas acabaram presos e ficaram sob a responsabilidade de Filinto Müller para interrogá-los. Plínio Salgado , ao final, foi exilado em Portugal . A AIB foi uma organização política que conquistou a simpatia de muitos empresários, de uma parcela da classe média e de parte dos oficiais das forças armadas.
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Comentário por Bryon Norris — janeiro 31, 2013 @ 17:43 |
[…] assessoria do Arquivo, que me deixou muito feliz. Conheci a Sra. Carmela Patti Salgado, esposa de Plínio Salgado, a qual, quase todos os finais de semana no final dos anos 80 esteve presente na instituição […]
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Pingback por Plínio Salgado – seu acervo que está no Aruqivo Público e Histórico de Rio Claro recebe selo da Unesco | A Simplicidade das Coisas — Augusto Martini — outubro 12, 2014 @ 13:15 |
Estou me apaixonando pelo integralismo pois a melhor coisa que se sente é quando você passa a tomar conhecimento das teorias e manifestos deste então conhecido mas não explorado como o faço-o agora, pois nunca tive o interesse de investigar a fundo esse movimento integralista até porque logo de ante mão lhe foi passado como sendo de teorias nazistas, e como tal nem se quer quisemos saber a fundo suas teorias, pois leva-se em conta a aproximação de ritos e formas muito parecidas com o nazismo, pois eis um dos grandes motivos de muitos não aderirem, mas agora depois de meus 42 anos de idade vima me interessar pela ideia, mas visto também o real quadro político de nosso país que está ficando em descrédito popular, mas tem muitas coisas que tenho que estudar a finco pois é interessante que as ideias aqui expostas, elas simplesmente configuram com as minhas, e penso eu que em certa parte sou até mais exigente que eles , pois digamos assim linha dura em termos de seguimentos dialéticos !
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Comentário por André Luiz Bezerra — fevereiro 20, 2015 @ 2:48 |
Bom dia Luiz.
Fico feliz com sua visita por aqui.
Quando tiver um tempinho, vá até Rio Claro, faça um agendamento e visite o acervo de Plínio. Garanto que irá gostar.
Abraços.
Augusto
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Comentário por Augusto Martini — fevereiro 20, 2015 @ 8:33 |
Sou o Presidente do Movimento Integralistas e LInearista Brasileiro MIL-B e temos um Arquivo tamb~em Integralista em Campinas. Anaue.
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Comentário por Cássio Guilherme — junho 1, 2016 @ 13:27 |